domingo, 12 de julho de 2015

Tíbia

cruzo ruas e avenidas
pontes e vielas
percorro fiel meus caminhos de sempre
memória é coisa rara
o passo estranha qualquer mudança
grades sobre a calçada antes livre
tropeço e dou de joelhos
uma luz negra me toma a vista
o pastor aos berros avisa algo
a rua está infestada de carros estacionados
o zunir das motos no seu vai e vem
o funk fala mais alto
e o pastor não se rende fácil
queria gritar também
mas sussuro uma tempestade de palavrões
enquanto massageio meu joelho
e recupero a vista

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

espera provisória

nestes dias que andam fazendo
poemas nada

travo com o tempo um espaço tremendo
entre a raiva e o esquecimento

baratas passeiam pela casa

sexta-feira, 27 de junho de 2014

minha janela é uma tv

chorando a gente lava a alma
depois dançamos riscando o chão da sala
a janela transmiti um amistoso de rua
um colorido menino na laje me sorri
e o seu sorriso aponta um céu infestado de pássaros de vareta, papel de seda e rabiola
o sangue jorra, dedos da mão cortados
mas comemora e sei o que
sabemos o que
e riscamos mais ainda o chão de nossa sala
a rua urra: é relo, rélouuuu, rélouuuuuu, dig-dig rélouuuu
assisto minha janela com a mesma graça que dona Ana da rua 15 chora vendo novela na tv

domingo, 15 de junho de 2014

bem-vindo

                                                                                                            pra Juliana Bernardo

enquanto cá, neste bar, o espero chegar...
muitos da areia da praia de dentro ainda avistam a linha reta do mar e todavia acham que ali se finda o mundo, que ali se acaba, que ali há um abismo.

enquanto pisco lento nesta espera...
meninos meninas, sonham suas pipas no ar relando todas as outras pipas no imenso céu que cobre a favela.

enquanto por pouco não caio da cadeira nesta espera...
Carla chove o leite derramado pelo filho que morreu tanta era a pobreza.

enquanto me desmonto de cara e braços na mesa...
Pedro assalta e teme os justiceiros filhos de uma égua.

enquanto durmo e babo...
Micaela e Notório aprendem a ler com muito custo.

enquanto sonho...
Léia taca pedrinhas na janela de sua amada.

enquanto ronco sonho...
Minha gente pula e burla este sistema de catracas, esta muralha diária, esta montanha de grana, este portal de girar capital, de encher o bolso de pilantras.

enquanto profundo fundo sonho...
Francisco diz na altura de seus quarenta e poucos anos que a vida é pouca e estrala os grandes ossos da mão e conclui sorrindo.

enquanto te vejo e beijo e nem sei que é sonho, afinal sonho...
os pais de Micaela e Notório choram, pois agora há quem possa ler as cartas guardadas.

enquanto quando agora desperto e desesperado...
Bernardo e Juliana, num cambio de idéias se deparam com que/com quem eu esperava.

é quando levanto já cansado de tamanha espera, resolvo e doo os pés à areia além bar, pra lá, pra mar...
avisto de olhos acordados vozes satisfeitas, muitos gestos trançados e um incensário expelindo sua fumaça, avisto tudo que a vista abraça e escuto atento, longe, quase longe alguém que conversa a minha espera, a minha tremenda espera, aguardada e lamuriosa espera.
me desfaço e perdido me aproximo tímido e pouso a cabeça pesada no colo deste menino que fala a esta menina que diz a este menino que a poesia e os possíveis poemas estão em tudo e em nós, em ti, em mim e eu por fim me encontro com o tão aguardado: intorpecente palavra.

a poesia está em tudo, Ariosvaldo. diz Juliana e Bernardo


(Ao som de Clube da Esquina, número 2)

sábado, 17 de maio de 2014

Benê


                                                                                                         pra Benedito, el gato

eu né,
caso pense em teu nome
me vem de imediato esta inspiração profunda...
que é de claro sintoma, SAUDADES

se lhe penso, Benedito
inspiro e expiro...
é dificil

movimentos desconhecidos
num buraco que se instalou
depois que você sumiu, amigo

eu te quero
e sempre ei de querer
mas devemos concordar, é dificil...

esta ausência
esta falta de notícia
esta vista que não alcança
este instinto coxo:
não dão conta
não me dão a conta
não me pagam a conta

este coração faliu, amigo
depois que você, partiu

domingo, 11 de maio de 2014

Mãe

                                                                                                       pra Fátima

amanheceu tarde esta manhã
mamãe não me chamou
a luz gritava e transbordava da janela
disparando raios nem tão trovões
eram raios mansos
é ínicio de inverno no Brasil
chuvisca ralo e venta bem gelado

mãe acha que não sou mais criança
mas vive me chamando a atenção

do quarto ainda posso ouví-la
ela fala (mãe fala bem alto)
meu pai escuta
devem estar tomando café, penso

saco os dois cobertores, um verde, um beje
somando os dois, dá um barato só, puro verão

no que levanto
os joelhos já se esfriam
enquanto busco um agasalho
ainda escuto ela falar
mas a tv já está ligada, provavelmente meu pai assiste
mas mãe fala
parece que fala sem necessidade de que alguém a ouça
mas eu ouço

abro a porta
escovo os dentes
e desço
ela prepara um macarrão
peço um beijo, lhe dou um abraço
ela deixa, mas não diz nada
cansou de falar, penso
puxo assunto, mostro uma música
não deve ser fácil ser mãe no dia das mães
ela diz que tem macarrão sem carne pra mim
agradeço e encho uma xícara com café

lhe dou umas miradas
penso um montão, mas não digo mais nada

esse jeito
esse genio, eita jeito bravo da porra de ser
eita mãe, suspiro

já não caibo em seu colo
já não lhe beijo antes de dormir
já não sei como dizer

a gente se espalha nas ancas dos dias
e se deixa tragar por este planeta
porra, mãe
vim daí
eu sou daí
sou você


meu sorriso também sobresalta as maçãs do rosto
também apontam o céu
também enrrugam os olhos
e me enfestam de felicidade
e me deixam sem fôlego

mãe
quando gargalhamos na rede
vi que eu era você, você era tão eu e tão sua mãe
tão planeta, tão estrela, um universo confuso de tão humano
burro, forte, mulher, mãe

eita bixiga de vida
cê bem mereceu um filho assim
quem mandou ser este poço
esta delicadeza
esta mina
este rojão aceso
e BOOM
choramos juntos
mãe, você é maior poeta que conheço


não engasgue


me encanto
se ainda me encanto, que graça
me restam chances
sem dúvida, me restam chances
que graça
a vida
essa praça
essas figuras
essas minúsculas sombras
essa mulher
esta mulher
e essa mulher?
meu amigo, o que foi aquilo?
tanto adormeço
tonto
mais pareço um dois pegas de leve
aquela primeira vez
quanta viagem
mas essa, essa, mais esta
ah, e deixo que seja
que sejo
que me trevo
que me sorte
intento
sento
essa praça, e esse bendito único banco
sento
posso? pergunto
mas sento
essa maneira de iniciar
oi, olá, cê sabe, cê viu, tá sabeno
que graça
ela riu
campanhia e vãozinhos entre os dentes
que fantástico, rápido, ainda pensei, que lindo seria
mas não foi, me engasguei e quem ela esperava chegou e acenou do outro lado
mal trato da porra, merda, que merda, cuspi o chiclete e busquei os cigarros


(mas eu não fumo, hahahah)
                                                                                                                               pra Jair

de que me servem centenas de milhares de palavras, essa sabedoria 5 anos de estudo, estes papéis enquadrados na parede da sala, esses documentos, o dinheiro que carrego nos bolsos, estas músicas, a literatura, duas línguas, estas viagens.
se o susto de lhe perder no abismo da morte, só me faz esse isso coisa sem nome, sem palavra.

traças-casa-coração


de você restou apenas um sutiã e uma calcinha, ambas salgadas de mar, agora já secas, mas visivelmente repletas de areia, enroladinhas em teu vestido branco florido de cores diversas, não vou jogá-los fora, é certo, mas quando der, vê se passa aqui, estou tendo problemas com traças.

terça-feira, 29 de abril de 2014

caçando na memória o
que é amor
só encontrei teu nome

fui fundo;
traumatismo craniano

por la avenida Pueyrredón

                                                                                                     pra Mijaíla

sempre que aqui chego
teu nome me salta de lejos
fundamental dizer a ti
o que sinto

dois anos
e nada mais

estruturas rígidas
estas as minhas
este coração feito sem pedras
todo de perdão
segue esta avenida de nome Pueyrredón

não me basta a vida
não me basta

teus caminhos assim
ruguinhas no canto dos olhos
minha mão sobre a tua

sempre não mais
fundamentalmente dizer a ti:
que bien encontrarte

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

sábado, 1 de fevereiro de 2014

sábado, 24 de agosto de 2013

luz acesa
como se fosse e nem vai chegar ninguém
a saudade é uma porra mesmo
eternamente acesa

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

rogar

meus olhos te cercam
e se acercam dos teus
estes tão pequenos e saborosos olhos
adornados por transparentes auxiliares
que te anulam o defeito
tornando-lhe capaz de enchergar
mais para lá de teus acurtinados cabelos escuros

e penso, quão bonito é ver você ver
e sonho teus olhos enquanto ainda não vejo

sussurro as pontas dos dedos
soletrando cada detalhe do abismo que é teu rosto
fungadores tragando e expulsando ares desordenados
a testa se ilumina
a língua salta
e a boca cheia de dentes e palavras
se reduz em monossílabas das quais quero seguir rogando

sábado, 13 de julho de 2013

esparramar

repouse calmo teu braço aqui
lance tranquilo teu papo no meu ouvido
que é sensível ao estalo de lábios
que encharca os meus lábios
recolha e envolva minhas mãos no teu colo
e deslize teus pés em minha perna
e adormeça pra só amanhã despertar
deste sonho tão bom que é estar e estar, estar, estar...

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

esporro

noites em que
                           a todo custo
    não durmo,
    me masturbo.

que da minha insônia
                           faço gozo
                           esporro